Sou velha mas não sou burra

Vocês lembram daquele comercial onde dois jovens lutam para usar um eletrodoméstico e, diante da surpresa deles quando uma vovó resolve o problema, ela solta a frase: “Sou velha, mas não sou burra”? Ao longo dos anos a velhice tem sido associada à falta de capacidade para acompanhar novos hábitos e tecnologias. Sou de marketing, e me lembro de como os dados demográficos (que incluem idade) eram usados para definir o perfil do usuário. Se você é jovem, é necessariamente antenado, esperto e ousado. Se é velho, está ficando meio sem noção, lento e desatualizado.

Tivemos alguns marcos na propaganda brasileira, com as campanhas das vovós do Itaú, que desmistificavam a dificuldade do aplicativo do banco no celular, e a velhinha da série “Folgado”, que era da pá virada.

As vovós da campanha do Itaú

Então deixa eu te contar uma história. Minha mãe e minha tia têm mais de 70 anos e uma diferença de 3 anos entre si. Eu gosto muito de criar playlists musicais, e certa vez gravei um CD em MP3 para mim que ficou tão legal, que resolvi copiar para minha mãe. Mas pensei: onde ela vai ouvir MP3? Será que o novo som dela em casa já tem esse formato? Bisbilhotei, o aparelho era novo e tinha sim. Pensei: ela e minha tia são unha e cutícula. Vai ficar chato dar o CD para uma e não dar para a outra, mas onde minha pobre tia vai arrumar de escutar MP3? Ah, ela tem computador em casa, pode ouvir lá. Assim que entreguei os mimos para elas, minha mãe na lata comentou: “Que bom, vou poder ouvir no carro!”, e minha tia emendou “Eu também!”. “Ué, vocês têm MP3 player no carro?!?” perguntei surpresa. Eu não tinha. No que minha mãe declarou “Coitadinha, no seu aniversário eu te dou um de presente”. 1 x 0 pra ela.

Um belo dia meu iPhone toca e vi pelo bina que era minha mãe, ligando de S.Paulo para mim no Rio. Tínhamos esse costume dela ligar todo domingo pela manhã para bater papo. De repente, a cara dela aparece na tela! Era uma video-chamada de FaceTime. Eu nem sabia que tinha isso no celular. Passei a usar e “tomávamos café” juntas em videocall. 2 x 0 pra ela.

Minha mãe estava viajando nos EUA e num belo dia recebo uma mensagem no meu celular: “este é meu primeiro email enviado do meu novo iPad.” Ela já comprou também o iPad-mini e um netbook. Eu não tenho nada disso. 3 x 0 para ela.

Minha mãe ensinando a minha tia a mexer no seu novo tablet

Enquanto estou entrando no site do banco para pagar contas, minha mãe me anuncia que agora não quer outra vida: instalou o app do banco no celular e paga tudo com o scan do código de barras, porque acha muito chato ficar digitando. Faz apenas seis meses que eu me convenci a usar esse recurso. 4 x 0 para ela.

O que a gente conclui disso tudo é que ser antenado é muito mais uma questão de curiosidade e disposição do que ser jovem ou velho. Ao longo dos últimos 35 anos, minha curva de aprendizagem teve que incluir telex, fax, email, impressora e scanner. Celular tijolaço, startak e smartphone. Linha fixa caríssima, internet discada e wifi. Disquete, zip drive, floppy disk, videocassete, CDrom, pendrive e nuvem. Icq, Orkut, Facebook, Pinterest e Whatsapp com ligação via internet. Continuo sem saco para Snapchat, Instagram e Twitter. Acho selfie um horror, fico com cara de cachorro. Uso direto o Shazam para montar minhas playlists, que me recuso a deixar na nuvem.

E talvez seja isso, a gente vai absorvendo as novas tecnologias e mídias indispensáveis e mais amigáveis, vai impondo alguns limites por pura falta de paciência, pede ajuda para o sobrinho mais novinho quando o bicho pega, e segue em frente nesses 30 anos a mais que ganhamos para viver e ver coisas incríveis.

3 comentários

  1. Olá Patrícia!! Sua mãe e sua tia são lindas!! Poxa, sua mãe te deu “um banho”!!! Kkkkk
    O que falta na geração anterior a nossa é reconhecer que a tecnologia foi uma herança que eles deixaram para a atual geração que, como um todo, não reconhece isso. Mas alguns, da geração de sua mãe descobrem que unindo o conhecimento adquirido ao longo dos anos, a sabedoria de usar bem todo esse conhecimento e a disposição de usar as novas tecnologias transformam suas vidas e mostram a essa geração “ingrata” que a sabedoria está, na realidade, com aqueles que tiveram o grande privilégio de terem nascido primeiro que nós!! Parabéns à todos os idosos que fazem de suas vidas uma lição a ser seguida, que lutaram para tornar o mundo mais fácil de viver com a tecnologia!!! Beijinhos, Silvânia Alves!!

    Curtir

Deixe um comentário