Contribuição de Luiz França Reis*

O que você faz quando percebe que envelheceu e a saúde abandonou seu corpo deixando, de quebra, sequelas ?
Pior que isso é acordar diariamente, sabendo que sua mente já atingiu o ápice, em obras que o tornaram famoso, mas o caminho a partir daí é o declínio.
Há, ainda, a questão do tempo … as reminiscências do que se foi e a incerteza sobre o que ainda lhe resta.
Numa obra de tom declaradamente autobiográfico, Pedro Almodóvar reflete sobre estes temas de uma forma poética e, simultaneamente, madura: ora revisitando seu passado, sob a encantadora forma de um menino (Asier Flores) com sua mãe (Penélope Cruz), ora no presente, representado por Antonio Banderas, o ator que mais trabalhou com o cineasta. Há muito caráter, aliás, na decisão de carreira de Almodóvar em permanecer filmando na Espanha … e em reconduzir seu ator-símbolo ao país nativo. Banderas, contido e soberbo como há muito não se via, mereceu amplamente o prêmio de melhor ator em Cannes.
Em DOR E GLÓRIA, o outono da vida se faz presente: sem a explosão de outrora, as cores na tela (especialmente o vermelho nos cenários) ainda são marcantes e as roupas, menos extravagantes e mais convenientes.
O presente acolhe as lembranças do passado e usa o tempo como um pacificador de mágoas, em lindos reencontros com o início da sexualidade e, possivelmente, seu fim.
E Almodóvar, que girava em falso com sua triunfal mas desgastada fórmula de cinema exagerado e “à beira de um ataque de nervos”, encontra uma nova forma de prosseguir…
A maturidade, como pessoa e cineasta.
Como cunhou, de forma definitiva, Fernando Pessoa:
“O que fica do que passa,
O amarelo atual, que as folhas vivem …
e as tornam diferentes.”

(*) LUIZ FRANÇA REIS é engenheiro de formação, vendedor de profissão e escritor de coração. Aos 51, está naturalmente cheio de boas ideias, muita curiosidade e amor pela vida.